A liberdade de expressão e o
direito á informação são direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal
Brasileira como componentes da cidadania. No entanto, pertencem a duas
categorias distintas: a livre expressão é um direito civil enquanto o direito á informação está entre os direitos sociais,tal
como saúde, educação , segurança e trabalho . Não raro se estabelecem tensões
entre os direitos individuais e coletivos que exigem limites para evitar a
supremacia de um em detrimento da garantia do outro. Apesar de reconhecer o
direito à livre expressão o próprio legislador, no Brasil, admitiu a
necessidade de regulamentação de alguns itens relativos á comunicação, por
exemplo, na propaganda de tabaco, álcool, medicamentos, agrotóxicos etc. A
respeito da convivência entre os direitos fundamentais acima referidos, o
filósofo Norberto Bobbio em seu livro A era dos direitos propõe para superação
do conflito de concorrência entre eles: “a dificuldade se resolve com a
introdução dos limites à extensão de um dos direitos, de modo que seja em parte
salvaguardado também o outro”. Por exemplo, no direito á liberdade de expressão
por um lado, e no direito do outro de não ser enganado, escandalizado,
injuriado ou difamado. Nestes casos, deve-se falar em direitos fundamentais não
absolutos, mas relativos, no sentido de que a tutela deles se encontra um
limite insuperável na tutela de um direito igualmente fundamental, mas
concorrente”. A revista satírica
francesa Charlie Hebdo é reincidente na
sua atitude desrespeitosa com o alvo de suas críticas . A questão fica
mais complexa quando este alvo são lideres religiosos. Basta lembrar a intolerância
demonstrada em vários países com
abordagem do filme ” Jesus Cristo superstar". Scott Long , ativista
americano em direitos humanos, em seu artigo “Porque não sou Charlie”( FSP 18
de janeiro de 2015) lembra que a sátira não deixa de ser um exercício de poder,
um olhar por cima dos pobres mortais e que tem efeitos bem diversos quando
atingem poderosos ou quando atinge minorias como é o caso da comunidade
islâmica . A sátira dirigida aos mais frágeis pode inclusive legitimar e
acirrar preconceitos. Ironizando o profeta Maomé, grande líder fundador do
islamismo não se está atingindo só ele, mas a toda uma corrente religiosa que
ademais de ser , desde os primórdios, uma rival do cristianismo, tem sérios
ressentimentos ao Ocidente em decorrência do combate sofrido ao longo dos
séculos. Convém lembrar também que os mulçumanos sempre expandiram sua fé por
meio da força e de conquistas militares. Por sua vez a violência perpretada
pelos cruzados no Oriente médio são feridas abertas entre as duas correntes
religiosas. Considere-se ainda que o
Alcorão, como todo livro fundador das religiões, tem interpretação diversa por parte
das diversas correntes de seguidores quando diz: “ quem mata uma pessoa , sem
que haja cometido crime ou semeado a corrupção na terra, é como se tivesse
matado toda a humanidade”.Ora,se no entendimento de um fanático muçulmano os cartunistas semearam a corrupção ao ridicularizar
o profeta, deveriam ser mortos(?!).Considerando
este contexto histórico, fica ainda mais complexa a análise das decorrências do
deboche da imprensa francesa contra o profeta Muhammad( 570-632) . Em análise
simplificada e sob a ótica da nossa Carta Magna artigo 221 §IV ,o respeito aos
valores éticos e morais devem ser considerados em todo veiculo de comunicação,
preceito não observado pelos cartunistas do Charlie que avançaram sobre o direito
do profeta e de seus seguidores de não sofrerem vilipendio ou dano moral. O
caminho de combate à violência, ao terrorismo e ao fanatismo não é outro senão
o da abolição do preconceito, do diálogo e das ações políticas que estimulem a
solidariedade e o respeito aos diferentes. Convém deixar bem claro meu veemente
repudio ao assalto e assassinato dos cartunistas, mas por toda argumentação
acima devo declarar que também não sou Charlie.